Gullar é um escritor Maranhense ainda vivo, que tem trilhado uma diversificada carreira na nossa literatura, sendo um dos principais nomes dos Movimentos Concretistas e NeoConcretistas no Brasil.
O livro Muitas Vozes foi publicado em 1999, quebrando a “abstinência” do poeta que há 12 anos não publicava poemas em livros, sendo, para alguns críticos, uma obra de maturidade do autor do célebre “Poema Sujo” – escrito durante o Regime Militar no Brasil – dentre muitos outros trabalhos como o cordel ” João Boa Morte: cabra marcado para morrer”, inspiração para o filme de 84 “Cabra Marcado para Morrer” (mais) do diretor Eduardo Coutinho.
Este poema maravilhoso marca uma metalinguagem típica do autor que, em magníficadas metáforas tenta explodir a loucura do pensar palavras, escrever palavras e toda a carga que elas têm dentro de nós.
Atualmente, o livro está na lista de obras escolhidas para o vestibular da Universidade Federal do Paraná.
Muitas Vozes
Meu poema
é um tumulto:
a fala
que nele fala
outras vozes
arrasta em alarido.
(estamos todos nós
cheios de vozes
que o mais das vezes
mal cabem em nossa voz:
se dizes pêra,
acende-se um clarão
um rastilho
de tardes e açúcares
ou
se azul disseres,
pode ser que se agite
o Egeu
em tuas glândulas)
A água que ouviste
num soneto de Rilke
os ínfimos
rumores no capim
o sabor
do hortelã
(essa alegria)
a boca fria
da moça
o maruim
na poça
a hemorragia
da manhã
tudo isso em ti
se deposita
e cala.
Até que de repente
um susto
ou uma ventania
(que o poema dispara)
chama
esses fósseis à fala.
Meu poema
é um tumulto, um alarido:
basta apurar o ouvido.
texto por S.